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Sobre Drogas

A dimensão do problema do consumo de drogas no Brasil e no mundo

O fenômeno do uso de drogas é complexo e o debate sobre o tema aborda aspectos muitas vezes conflitantes. Por um lado, sabe-se que os seres humanos sempre buscaram na natureza substâncias que alterassem seu estado de consciência, desde o início de sua história, levando a ideia de que este é um comportamento que faz parte da natureza humana e, portanto, deveria ser aceitável. Por outro, temos as questões da saúde pública, com provas irrefutáveis de que o uso dessas substâncias, lícitas ou ilícitas, pode causar danos não só para a saúde física, mental e social do próprio indivíduo, como também geram um enorme fardo para a sociedade em que está inserido (UNODC, 2021).

Trata-se do aumento de gastos no sistema de saúde (acidentes e sobrecarga no tratamento de condições de saúde física e mental, agudas e crônicas decorrentes do consumo), de previdência social (perda da capacidade laboral) e de segurança pública (associações do consumo com violência doméstica e urbana e seus impactos sociais). 

Os prejuízos relacionados ao uso das substâncias legalmente comercializadas principalmente (álcool e tabaco) configuram entre as principais causas de morte precoce e incapacidade no mundo (WHO, 2018).  Sendo assim, apesar de ser um comportamento intrínseco à natureza humana, o impacto negativo do consumo de substâncias é inquestionável, precisando, portanto, ser inibido, postergado ou prevenido.

A seguir falaremos das principais substâncias psicotrópicas, informação básica, efeiro e riscos.

Maconha

A

s recentes modificações em termos de potência da maconha fazem com que se torne difícil a classificação da droga em termos das grandes classes de psicotrópicos, uma vez que, dependendo da concentração do seu princípio ativo, seu uso pode levar a efeitos sedativos, estimulantes e também psicodélicos. Análises da composição da droga apreendida nos últimos anos têm mostrado um aumento significativo da concentração de THC, que atualmente apresenta uma média de 12%, comparado a 4% no início dos anos 2000 (Cash, Cunnane, Fan, & Romero-Sandoval, 2020). Sabe-se que o uso de variações com maior potência (maior concentração de THC) está diretamente relacionado a maiores chances de efeitos nocivos (Wilson, Freeman, & Mackie, 2019)(Freeman et al., 2021; Seillier, Martinez, & Giuffrida, 2020) Destaca-se que as amostras de droga apreendida possuem concentrações ínfimas ou inexistente do canabinóide CBD, conhecido pelo seu potencial terapêutico. Os efeitos da maconha são extremamente variáveis, uma vez que dependem não só das concentrações e balanço entre de seus dois canabinóides principais (THC e CBD) mas também são influenciados pelo balanço destes com mais outros 60 canabinóides também presentes na planta.

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Referências:

Cash, M. C., Cunnane, K., Fan, C., & Romero-Sandoval, E. A. (2020). Mapping cannabis potency in medical and recreational programs in the United States. PLoS One, 15(3). doi:10.1371/journal.pone.0230167

ElSohly, M. A., Mehmedic, Z., Foster, S., Gon, C., Chandra, S., & Church, J. C. (2016). Changes in Cannabis Potency over the Last Two Decades (1995-2014) – Analysis of Current Data in the United States. Biol Psychiatry, 79(7), 613-619. doi:10.1016/j.biopsych.2016.01.004

Freeman, T. P., Craft, S., Wilson, J., Stylianou, S., ElSohly, M., Di Forti, M., & Lynskey, M. T. (2021). Changes in delta-9-tetrahydrocannabinol (THC) and cannabidiol (CBD) concentrations in cannabis over time: systematic review and meta-analysis. Addiction, 116(5), 1000-1010. doi:10.1111/add.15253

Seillier, A., Martinez, A. A., & Giuffrida, A. (2020). Differential effects of Δ9-tetrahydrocannabinol dosing on correlates of schizophrenia in the sub-chronic PCP rat model. PLoS One, 15(3). doi:10.1371/journal.pone.0230238

Wilson, J., Freeman, T. P., & Mackie, C. J. (2019). Effects of increasing cannabis potency on adolescent health. Lancet Child Adolesc Health, 3(2), 121-128. doi:10.1016/s2352-4642(18)30342-0

Fergusson, D. M., & Boden, J. M. (2008). Cannabis use and later life outcomes. Addiction, 103(6), 969-976; discussion 977-968. doi:ADD2221 [pii]
10.1111/j.1360-0443.2008.02221.x [doi]

Meier, M. H., Caspi, A., Ambler, A., Harrington, H., Houts, R., Keefe, R. S., . . . Moffitt, T. E. (2012). Persistent cannabis users show neuropsychological decline from childhood to midlife. Proc Natl Acad Sci U S A, 109(40), E2657-2664. doi:1206820109 [pii]

Drogas estimulantes

A

s substâncias estimulantes ativam a comunicação sináptica gerando uma excitação do sistema nervoso central. São drogas que tem um efeito euforizante de aceleração. Também são utilizadas para alívio de cansaço, permanecer alerta e supressão do apetite. Seus efeitos incluem aumento da pressão e batimento cardíaco e dilatação da pupila. Os efeitos subjetivos desejados das drogas estimulantes são principalmente a euforia, o aumento da energia e sensação de confiança. Invariavelmente drogas estimulantes podem gerar agitação extrema e insônia. São drogas com alto poder de dependência, gerando rapidamente tolerância e uso abusivo. Uso de altas doses pode levar a convulsões, ataque de pânico ou outros tipos de ansiedade, dor de cabeça, dores de estômago comportamento agressivo e quadros psicóticos.

Principais drogas estimulantes

Cocaína

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Cafeína

Crack

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Sintéticas - ATS

(Estimulantes do tipo das anfetaminas)

Nicotina

Estimulantes sintéticos

G

rande parte das drogas sintéticas de uso recreacional são estimulantes e compostas por variações da anfetamina ou da metanfetamina, moléculas relativamente fáceis de sintetizar, a partir de precursores baratos e disponíveis. Um dos principais efeitos das anfetaminas é a inibição do apetite, sendo assim, utilizada em fármacos vendidos (com prescrição controlada) para tratamento da obesidade. Esta mesma classe de estimulante é a base dos chamados “rebites”, nome dado quando o seu uso é no contexto de profissionais com a necessidade de se manter alerta em longas jornadas de trabalho. Existem centenas de variações desta molécula, chamadas análogas, que tem estrutura molecular semelhante e geram os mesmos efeitos, invariavelmente o estimulando, uma vez que são usadas predominantemente no contexto de festas, e muitas vezes vendidas como sendo Ecstasy (Quadro explicativo). Estas drogas são chamadas de ATS (Estimulantes do tipo das anfetaminas, no inglês: Amphetamine Type Stimulants) ou também NPS (Novas Drogas Sintéticas, no inglês: New Psychoactive Substances). Existem mais de dez diferentes variações das ATS, sendo mais conhecidas no Brasil, as Anfetaminas, Metanfetaminas, Catinonas Sintéticas (chamadas de sais de banho), as Fenetilaminas (exemplo as drogas do tipo M-Bome, também alucinógenas e muitas vezes vendidas como sendo LSD) e a maconha sintética, (THC sintético) (QUADRO explicativo). Todas são comumente componentes das pílulas vendidas pelo nome (agora genérico) de “Ecstasy” (Saiba mais no quadro abaixo). De forma geral estas são drogas extremamente neurotóxicas, seu uso regular causa danos no sistema nervoso que podem levar a déficits cognitivos e de memória bem como o desenvolvimento de transtornos psiquiátricos. Embora quimicamente tenham alto poder de dependência, seu uso pela via oral protege os usuários do desenvolvimento rápido do transtorno. Seu uso aspirado ou fumado trazem um grande risco de overdose.

Ecstasy

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Nicotina

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“VAPING”

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Drogas depressoras

A

s substâncias depressoras desaceleram a atividade normal do cérebro. Sua ação no cérebro gera uma inibição de sinais entre neurônios. Drogas depressoras produzem o efeito de relaxamento, calma e sono. O representante principal desta categoria é o álcool, porém uma série de drogas depressoras são utilizadas pela indústria farmacêutica para o tratamento de ansiedade e distúrbios do sono (Ex: Valium, Rivotril e barbitúricos). Seus efeitos a curto prazo incluem tontura, perda do balanço, coordenação motora e reflexos. A longo prazo, depressores levam a uma ampla variedade de condições mentais e físicas, afetando principalmente os sistemas digestivo e hepático. Todas as substâncias depressoras tem potencial de desenvolver dependência química. Os benzodiazepínicos estão entre as drogas prescritas mais usadas e abusadas no país. Possuem alto poder de dependência, produzindo rápida tolerância e sintomas de abstinência. A intoxicação de drogas depressoras pode levar a perda da consciência e morte por overdose.

Álcool

Benzodiazepínicos

Barbitúricos

Opióides

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Álcool

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O Álcool 

Consumir bebidas alcoólicas é um comportamento comum na maioria dos grupos sociais. Todavia este consumo acarreta riscos, desde danos para a saúde até consequências sociais, relacionados à sua capacidade de intoxicação (bebedeira) e propriedades aditivas (desenvolvimento do alcoolismo).

Recentemente a Organização Mundial da Saúde determinou a extinção da noção de “beber saudável”. Através de uma série de estudos foi verificado que por menor que seja a dose consumida, ainda existirá algum nível de risco, tanto comportamental (beber e dirigir, por exemplo), quanto fisiológicos (doenças do fígado e trato digestivo).

opioides

Opióides

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Os opióides

são originalmente drogas derivadas do ópio, advindo da papoula, mas a classe dos opiáceos é extensa, incluindo além de sua forma natural, também versões sintéticas e semi-sintéticas.

Os opióides são analgésicos potentes estando entre os fármacos mais utilizados para tratar diversos tipos de dor. Além do efeito analgésico, estas substâncias geram sensação de euforia e bem-estar e calma, sendo, portanto, largamente utilizadas recreativamente. Entre seus efeitos agudos também estão a tontura, sonolência, náusea, prisão de ventre, respiração reduzida. Sua intoxicação pode levar a perda da consciência, coma e morte. Embora importantes coadjuvantes na medicina, essas drogas tem alto potencial de dependência, gerando tolerância rapidamente e síndrome de abstinência quando o uso é interrompido abruptamente. Entre os sintomas de abstinência estão: inquietação, dores nos músculos e ossos, insônia, diarreia, vômito, calafrios e tremedeiras. O uso de heroína e medicações a base de opióides semi-sintéticos e sintéticos sem prescrição tem sido um dos maiores problemas de saúde pública nos Estados Unidos e Canadá, levando a mais de 63 mil óbitos no país em um único ano (REF UNODC 2021)

Drogas pertubadoras / Alucinógenas

lsd

LSD

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O

s alucinógenos são substâncias que não necessariamente estimulam ou deprimem o sistema nervoso central, mas modulam diferentes circuitos de forma a gerar alterações profundas no pensamento e na percepção dos usuários. Estas alterações levam a percepções distorcidas da realidade, afetando principalmente a percepção visual e a percepção do tempo. Seus efeitos também podem incluir alucinações olfativas e/ou auditivas. Entre seus efeitos subjetivos, não é incomum a experiência de dissociação (se sentir fora do próprio corpo). As drogas alucinógenas tradicionais (Acido Lisérgico (LSD), psilocibina (componente ativo dos cogumelos mágicos) tem baixo poder de dependência uma vez que não atuam no circuito da recompensa como as demais drogas de abuso. Sendo assim, não provocam a sensação de euforia que grande parte das drogas apresentam, mas intensificam os sentimentos já existentes no usuário, podendo, inclusive, levar a experiências desagradáveis com tristeza intensa e ansiedade. Popularmente acredita-se que levam a experiências capazes de expandir a consciência, o que seria a razão pela qual algumas destas substâncias são utilizadas em rituais religiosos (ex. da Ahayuasca). Grande parte dos alucinógenos disponíveis atualmente são de origem sintética, e muitas vezes combinam os efeitos alucinógenos a efeitos estimulantes, o que as tornam mais aditivas e perigosas. (Exemplo a classe das N-Bome’s, 2C ou 2CB bem como a classe MD). Embora tenham baixo potencial de adição, estas drogas oferecem riscos importantes quanto ao risco de desencadear quadros psicóticos (sintomas persecutórios, ou paranoia principalmente). Além de alucinação, os efeitos agudos destas drogas também são a tontura, náusea, aumento do batimento cardíaco e pressão, confusão, descoordenação motora e alterações abruptas de humor. Também deve-se considerar a exposição a riscos devido a distorção da percepção da realidade dos usuários. O LSD e a mescalina também geram aumento de temperatura, tremor, perda de apetite, sudorese, insônia e amortecimento dos membros. Todas apresentam o risco de quadros de ansiedade como ataques de pânico e desencadeamento de quadros psicóticos persistentes. Existem poucos estudos descrevendo os efeitos a longo prazo destas drogas.

Principais alucinógenos

LSD

Psilocibina (presente nos cogumelos)

DMT (componente ativo da ahayuaska)

Ibogaína

25B-NBOMe

PCP

Anestésicos dissociativos

opioides

Ketamina

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A

NESTÉSICOS DISSOCIATIVOS As substâncias dissociativas são uma classe de anestésicos, usados recreacionalmente por também gerar efeitos euforizantes e alucinógenos (efeito dissociativo, que é a sensação de estar fora do próprio corpo). Entre os efeitos procurados também estão o aumento da libido e sensação de empatia. A principal droga dessa categoria que é abusada é a quetamina, atualmente comercializado para utilização veterinária. Também parte desta categoria é a droga GHB (Gama-hidroxibutirato), que tem ação semelhante a da quetamina, porém com um efeito agudo particular: a amnésia retrógrada. Embora usada involuntariamente no Brasil, como recurso para estupros e assaltos (quando é chamada de “Boa noite cinderela”), é cada vez mais usada recreacionalmente. Com alto poder de dependência, estas drogas são geralmente aspiradas ou ingeridas (misturadas em água, como o caso do GHB) e geram tolerância rapidamente. Outro efeito importante do uso regular de drogas anestésicas é o risco de lesões hepáticas, uma vez que são altamente tóxicas. A quetamina também pode levar ao aumento de secreções respiratórias, em altas doses pode deprimir a respiração e provocar vômito, aumentando as chances de morte por depressão respiratória ou sufocamento. Provoca aumento da frequência cardíaca e pressão arterial, aumentando o trabalho cardíaco, sobrecarregando as coronárias e podendo levar ao óbito por infarto . Combinado aos efeitos procurados de euforia e aumento da libido, as drogas dissociativas também provocam tontura, náusea, vômitos, sedação, perda de coordenação motora, paranoia, ansiedade, ataques de pânico, supressão respiratória, taquicardia ou bradicardia. O uso regular de altas quantidades a longo prazo está associado ao desencadeamento de distúrbios de humor e/ou ansiedade, prejuízo da memória, danos renais, arritmia, hiper-ou-hipotensão e apneia noturna.

Principais dissociativos

Ketamina ou Cetamina

GBH (Boa noite Cinderela)

GBL

Solventes inalantes

lanca-perfume

Lança-perfume

#saiba +

O

s inalantes são substâncias altamente voláteis que são inaladas em sprays ou em tecido embebido no líquido. Na sua maior parte são solventes industriais pertencentes a classe dos hidrocarbonetos (clorofórmio, éter ou tolueno), sendo, portanto, vendidas legalmente. Produtos como colas, thinner, esmaltes, removedores, vernizes e tintas contém esses componentes e podem ser usados por seus efeitos psicotrópicos. Estas drogas são usadas recreacionalmente pelo seu efeito euforizante, que dura, porém, poucos minutos. De forma geral os solventes são drogas extremamente neurotóxicas e hepatotóxicas, levam a prejuízos importantes da memória e cognição bem como a doenças hepáticas e renais.

Principais solventes

Lança-perfume

Benzina 

 

Cola de sapateiro/ Loló

Sobre padrões de uso de drogas

Os prejuízos relacionados às drogas não se restringem apenas aos indivíduos que desenvolvem o transtorno da dependência química. Danos físicos e/ou psicológicos podem ser também consequência do padrão de consumo da droga, e a isso chamamos “Uso Nocivo”. 

Efeitos nocivos podem estar associados ao uso de determinada substância em uma única ocasião, como por exemplo ter uma overdose ou sofrer alguma lesão resultante de intoxicação – bem como pode estar associado ao uso crônico de longo prazo, mais relacionado à dependência, como problemas de saúde e uma série de problemas sociais, jurídicos, financeiros e emocionais.

Qualquer substância pode ser usada de forma nociva, e geralmente, é exatamente o padrão de uso nocivo que tem maior impacto negativo na sociedade como um todo, pois é praticado por uma proporção maior da população, não dependendo do desencadeamento ou não da síndrome de dependência. 

Isso vale principalmente para drogas lícitas, como o álcool, em que uma prevalência muito grande da população consome. 

Existem diferentes indicadores de consumo para substâncias específicas, mas, de forma geral, podemos classificar o padrão de uso de qualquer droga seguindo os indicadores propostos pela OMS: 

Classificação de padrões de uso da OMS
Uso na vidauso da substância pelo menos uma vez na vida.
Uso no anouso pelo menos uma vez nos últimos 12 meses.
Uso recente ou no mêsuso pelo menos uma vez nos últimos 30 dias.
Uso frequenteuso seis ou mais vezes nos últimos 30 dias.
Uso de Riscoimplica alto risco de prejuízo à saúde física ou mental do usuário,
mas ainda não causou doença física ou psicológica (i.e., quadros de uso abusivo
ou nocivo).
Uso prejudicialjá causa prejuízo físico ou psicológico (i.e., quadros de dependência).

A OMS apresenta, também, uma classificação que organiza os indivíduos conforme a intensidade do consumo. Essa organização é interessante principalmente para profissionais que ainda estão pouco familiarizados com quadros de TUS e que podem ficar confusos com algumas argumentações de pacientes, por exemplo: “Uso pouco”, “Só uso quando tem”, “Uso socialmente”, “Quando uso, costumo usar muito”. Essas quantificações são imprecisas e, muitas vezes, tornam a anamnese pouco objetiva. De acordo com a intensidade do consumo, para a OMS, o usuário pode ser:

Classificação de padrões de uso da OMS
Não usuárionunca utilizou
Usuário leveusou, no último mês, menos que uma vez por semana
Usuário moderadousou na última semana, mas não diariamente
Usuário pesadoutilizou diariamente no último mês
Padrão de Uso conforme OMS
Padrões de consumo de específicos para bebidas alcoólicas:

Segundo a OMS, a frequência, a quantidade e as circunstâncias do consumo são aspectos importantes da análise do padrão de uso de álcool, que devem serem monitorados, visto que esses padrões de consumo têm sido associados à mortalidade e à carga de doenças.

Embora indicadores de padrão de uso sejam importantes no contexto clínico, a determinação de indicadores objetivos e universais são fundamentais para estudos epidemiológicos. 

Nesse sentido, são geralmente estudados os seguintes indicadores:

Sobre a dependência química

A

dependência química é considerada atualmente uma SÍNDROME BIOPSICOSSOCIAL. O termo BIOPSICOSSOCIAL indica o caráter MULTIFATORIAL desse transtorno, que pode ser desencadeado com a combinação de fatores biológicos (como por exemplo a predisposição genética a capacidade de metabolização do corpo ou mesmo a natureza farmacológica da substância), fatores psicológicos (como por exemplo a existência de outros transtornos psiquiátricos como a depressão e a ansiedade, a habilidades socioemocionais limitadas ou o conjunto de crenças do indivíduo acerca da droga) e fatores sociais, que combinam a influência do ambiente (como por exemplo a disponibilidade de uma determinada droga) e a influência das suas relações, como por exemplo, vínculos familiares, escolaridade, exposição à violência, exclusão ou pressão de grupos. A existência de um conjunto amplo de sinais e sintomas que definem esta doença faz com que seja considerada uma SÍNDROME.

A dependência também pode ser caracterizada por suas alterações biológicas, uma vez que as chamadas “drogas de abuso”, ou substâncias psicoativas (SPA), são capazes de alterar o funcionamento do circuito de recompensa cerebral. A OMS (LINK PARA GUIA) descreve as SPA como substâncias que afetam os processos cerebrais normais da senso-percepcão, das emoções e da motivação. Essas substâncias irão invariavelmente ativar esse circuito gerando prazer e a repetição do comportamento de uso.  As diferentes substâncias psicoativas tem maneiras diferentes de agir no cérebro para produzir os seus efeitos. Ligam-se a tipos diferentes de receptores, e podem aumentar ou diminuir a atividade dos neurônios através de diferentes mecanismos, tendo, consequentemente, diferentes efeitos sobre o comportamento, diferentes taxas de desenvolvimento de tolerância, diferentes sintomas de abstinência, e diferentes efeitos a curto e a longo prazo. 

Para a Organização Mundial de Saúde (OMS), a dependência química é definida como o “estado psíquico e algumas vezes físico resultante da interação entre um organismo vivo e uma substância, caracterizado por modificações de comportamento e outras reações que sempre incluem o impulso a utilizar a substância de modo contínuo ou periódico com a finalidade de experimentar seus efeitos psíquicos e, algumas vezes, de evitar o desconforto da privação.

Segundo Laranjeira (2014- Referência livro do capitulo anexo), o conceito de síndrome de dependência representa uma importante ferramenta para o profissional da área, por vários motivos:

Ajuda a situá-lo quanto à existência e a gravidade do problema, bem como auxiliá-lo no mapeamento dos fatores de proteção e risco, capazes de interferir na evolução do quadro diagnosticado

Considera a dependência não apenas a partir de suas características biológicas, valorizando igualmente os aspectos psicossociais envolvidos

Representa um novo paradigma para o paciente e seus familiares, uma vez que proporciona explicações isentas de moralismo e imprecisões

Sobre o poder de dependência

A

ntes de tudo é necessário diferenciar o poder de dependência de uma determinada substância e a vulnerabilidade de desenvolver dependência de um determinado indivíduo. E é a combinação de ambos que irá aumentar ou diminuir as chances de que o fenômeno da dependência química se instale, com seus mais variados sintomas e sinais. Todavia, é relevante levar em consideração que o poder de uma substância de desencadear dependência está mais associado com à rapidez em que a substância age no cérebro do que com diferenças químicas quanto ao seu mecanismo de ação. Sendo assim, a via de administração é um fator fundamental quando se avalia o poder de dependência de uma determinada droga. Vias de administração que permitem que a substância seja rapidamente absorvida e levada para o sistema nervoso sempre terão um poder de dependência maior que as que levam mais tempo nesse processo.

Como a figura ilustra, drogas FUMADAS terão maiores chances de desencadear a dependência em comparação a drogas usadas por outras vias. Essa é a razão, por exemplo, que o crack apresenta um maior poder de dependência que a cocaína, uma vez que, ao chegarem no cérebro, são a mesma substância.

Sobre diagnósticos

C

ada pessoa tem diversas maneiras de se relacionar com as substâncias psicotrópicas. O modo como este uso interfere em sua vida deve ser avaliado por um profissional, observando a distinção entre o uso dessas substâncias pelo indivíduo, o uso abusivo e a síndrome de dependência química específica para essas substância. É importante lembrar que embora os manuais tragam classificações muitas vezes consideradas reducionistas de um fenômeno complexo, elas cumprem o papel fundamental de universalizar o entendimento da doença, permitindo um diagnóstico sem vieses subjetivos.

Os Manuais de Referência:

CID significa "Classificação Internacional de Doenças" e o número 11 indica a versão, ou seja, já foram feitas 11 atualizações e revisões desse código

DSM é uma sigla ingles (Diagnostic and Statistical Manual) que significa "Manual de Diagnóstico e Estatísticas" e o número 5-TR é usado para indicar que já foram feitas cinco revisões

Critério A: padrão problemático de uso de determinada substância, que leve a comprometimento ou sofrimento clinicamente significativo, percebido por pelo menos dois dos critérios a seguir, que devem ocorrer pelo período mínimo de 12 meses:

A substância é frequentemente consumida em maiores quantidades ou por um período de tempo maior que o pretendido.

Desejo persistente ou esforços malsucedidos na tentativa de reduzir ou controlar o uso da substância.

Muito tempo é gasto em atividades relacionadas a obtenção, utilização ou recuperação dos efeitos do uso da substância.

Fissura, desejo intenso ou mesmo necessidade de usar a substância.

Uso recorrente da substância, resultando em fracassos no desempenho de papéis em casa, no trabalho ou na escola.

Uso contínuo da substância, apesar dos problemas sociais ou interpessoais persistentes ou recorrentes causados ou piorados por seus efeitos.

Abandono ou redução de atividades sociais, profissionais ou recreativas importantes ao indivíduo devido ao consumo de substâncias.

Uso contínuo da substância, apesar dos problemas sociais ou interpessoais persistentes ou recorrentes causados ou piorados por seus efeitos.

Uso contínuo da substância mesmo em situações nas quais esse consumo represente riscos à integridade física.

O consumo é mantido apesar da consciência de se ter um problema físico ou psicológico persistente ou recorrente que tende a ser causado ou exacerbado por esse uso.

Tolerância, definida como: efeito acentuadamente menor com o uso continuado da mesma quantidade de substância e/ou necessidade de quantidades progressivamentmaiores de substância para atingir o mesmo grau de intoxicação

Abstinência manifestada por: síndrome de abstinência característica da substância utilizada e/ou uso da substância ou de similares na intenção de evitar os sintomas de abstinência

Os conceitos e critérios diagnósticos aqui apresentados devem servir para oferecer uma melhor compreensão dos casos estudados, auxiliando os técnicos de diferentes áreas a terem uma linguagem ao menos similar. Deve-se ter em mente que a categorização de uma pessoa usuária de substâncias psicoativas em algum desses critérios pode ter um forte impacto social e para o indivíduo.

Sobre o Alcoolismo

T

al qual a dependência de qualquer outra substância, a síndrome de dependência do álcool (SDA) é uma síndrome clínica caracterizada por sinais e sintomas comportamentais, fisiológicos e cognitivos. Nesse contexto, o uso do álcool alcança uma grande prioridade na vida de um indivíduo e as demais atividades passam a um segundo plano. Conceito psicopatológico para dependência de álcool proposto por Grifith Edwards e Milton Gross (1976) Segundo os autores, na dependência de álcool, ocorreriam os seguintes fenômenos:

Estreitamento do repertório do beber – Tendência a ingerir bebidas alcoólicas seguindo um padrão. A pessoa bebe a mesma quantidade, estando acompanhada ou não, nos dias úteis ou nos finais fins de semana. Os dias de abstinência ou de consumo baixo tornam-se cada vez mais difíceis de acontecer. Influências sociais e psicológicas ficam cada vez menos importantes (p. ex., bebia apenas para comemorar, agora bebe quando está feliz, triste, só ou na presença de outras pessoas, de dia ou de noite e em qualquer dia da semana).

Tolerância – Perda ou diminuição da sensibilidade aos efeitos iniciais do álcool. O indivíduo passa a necessitar de doses cada vez maiores para experimentar os mesmos efeitos agradáveis. Torna-se cada vez mais resistente e consegue exercer atividades que outras pessoas (não dependentes) com o mesmo nível de alcoolemia não conseguiriam.

Síndrome de abstinência – Sinais e sintomas psíquicos e físicos que ocorrem após a diminuição ou interrupção do consumo da substância. Quanto maior o grau de dependência, mais exuberante é o efeito da ausência da substância no organismo do paciente.

Saliência do comportamento de uso – Ocorre a presença de desejo persistente e tentativas frustradas de controlar o consumo. O indivíduo passa a utilizar a substância em maiores quantidades e maior frequência que o inicialmente planejado (p. ex., quando conta que sai para tomar uma dose e só volta após beber várias doses). Há um comprometimento funcional, pois o indivíduo passa a utilizar seu tempo de forma cada vez maior para adquirir, consumir ou recuperar-se das intoxicações.

Alívio ou evitação dos sintomas de abstinência – O consumo não é mais uma experiência unicamente motivada pelo prazer, passando a ser necessária para evitar os sintomas desconfortáveis da ausência da substância.

Sensação subjetiva da necessidade de consumir – É a própria fissura, isto é, a vontade intensa e subjetiva de consumir.

Reinstalação da síndrome de dependência após abstinência – Após algum período de abstinência, o indivíduo que volta a consumir rapidamente retorna ao mesmo padrão mal-adaptativo do uso (p. ex., indivíduo que tomava um litro de cachaça por dia, permaneceu um ano sem beber, voltou a usar a bebida e, em questão de semanas, retorna à quantidade de um litro por dia).

A partir dessa definição, foi observado que muitas outras dependências seguiam padrões semelhantes. 

É importante compreender que cada indivíduo desenvolve um padrão diferente de consumo de substâncias, possuindo diferentes chances de desenvolver dependência,  de acordo com os diversos fatores biológicos, psicológicos, ambiente sociocultural e a natureza da substância. Contudo, nenhum padrão de consumo de substâncias de abuso está isento de riscos. Todavia, o consumo de álcool em baixas quantidades e com alguns cuidados pode ser considerado um tipo de consumo de baixo risco.

Para obter ajuda consulte:

Download - World Drug Report 2021